Portugal é, quase 51 anos depois do 25 de Abril, uma Democracia madura, adulta e consolidada. O que não significa que “o pior dos sistemas com exceção de todos os outros”, como catalogado por Winston Churchill, seja um bem adquirido e irrevogável – em termos absolutos e não na interpretação que Paulo Portas faz da expressão.

O calendário de curto prazo prevê a realização de quatro atos eleitorais nos próximos meses – eleições regionais antecipadas na Madeira, eleições legislativas antecipadas, eleições autárquicas e presidenciais regulamentares. O País vai, portanto, a votos por mais do que uma vez num semestre, o que, numa análise puramente simplista, poderia revelar uma vitalidade democrática invejável e sem precedentes. Porém, o regime político não se esgota nos votos e a sua saúde não se mede pelo número de vezes que os eleitores são chamados às urnas.

O ambiente político tóxico que hoje vivemos e a conduta de alguns protagonistas deviam preocupar-nos e fazer-nos a todos refletir.

Por exemplo, um primeiro-ministro que foge ao escrutínio dizendo que tem mais que fazer do que responder às perguntas dos deputados – por inerência, dos portugueses –, que impõe que não volta a dar explicações a quem não for “tão transparente” como ele, que chantageia a Assembleia da República, que prefere mergulhar o País numa crise política para proteger os seus interesses particulares, subverte e corrói os alicerces mais básicos da Democracia.

Um Governo que se permite agravar ainda mais os problemas do nosso Estado Social com o objetivo de o desmantelar e entregar a prestação de serviços ao setor privado – o Serviço Nacional Saúde está pior, o Sistema Público de Educação está muito pior, os transportes públicos estão uma lástima, as políticas públicas de proteção social são inexistentes –, ou que, por exemplo, afirma sem qualquer pudor que a solução da crise crescente de habitação em Portugal não lhe compete, é responsável pela falência da confiança dos cidadãos nos políticos e no regime democrático.

Um líder partidário que faz da sua praxis a difusão de notícias falsas (fake news) e a deturpação de factos, que recorre ao insulto em outdoors e noutras formas de comunicação política acusando tudo e todos de serem corruptos, que fomenta o ódio e a intolerância, que, de forma cobarde e parasita, se alimenta do descontentamento e do desespero, tem apenas um objetivo, aliás já confessado: a implusão do regime democrático e a instauração de uma quarta república, totalitária e antidemocrática.

Sim, esta é parte da realidade com que estamos confrontados. E à qual devemos somar a tentativa de reabilitação política em curso de figuras como Pedro Passos Coelho que, apesar de se fazer desinteressado, está ansioso por voltar ao poder – PPC sempre foi mestre na arte da dissimulação –, e, para o conseguir, não hesitará em levar consigo a extrema-direita a tiracolo.

É por isso que nos cabe a todos, gente de esquerda e de centro-esquerda, mobilizarmo-nos para impedir o avanço desta agenda sinistra. Para isso, mais do que com palavras, temos que com atos e com propostas concretas fazer com que o País volte a confiar em nós. Temos que abandonar o discurso negativo, para o qual já ninguém tem paciência, e, com humildade e empatia, ouvir as pessoas e falar da sua vida concreta. Temos que ser capazes de equilibrar a defesa intransigente do Estado Social e do Estado-Providência com uma política de estímulos à economia que permita olhar as empresas como parceiras e não inimigas e, com isso, levá-las à valorização dos seus trabalhadores pagando-lhes salários dignos e respeitando os seus direitos. Temos que olhar para as políticas de acolhimento com humanismo, com sensibilidade, mas não deixando de refletir sobre a necessidade de haver regulação. Se o não fizermos, estendemos à direita e à extrema-direita a passadeira para nos encostarem à parede. E mais, a valorização da escola pública e a Educação têm que ser uma prioridade como é, aliás, da nossa tradição. E, já agora, não esqueçamos a Justiça. O sistema tem que, além de ser justo, célere e amigo dos cidadãos e da economia, tem que, tal como o SNS, estar acessível a todos e não perguntar a nenhum cidadão quanto dinheiro é que tem no bolso.

É minha convicção que, só desta forma, seremos capazes de resgatar o País e servir os portugueses com dignidade. Estou certo de que o faremos. Até porque, os que lutaram pela Democracia chegando muitos a pagar com a vida para que hoje aqui estivéssemos, jamais nos perdoariam se não o fizéssemos.

One Comment

  1. A agenda da direita, para além de dever ser desmascarada, é absolutamente nefasta à democracia e ao estado social. A democracia e os direitos que julgávamos adquiridos há décadas, estão ameaçados, em especial direitos humanos fundamentais.
    Segurança, migrações com dignidade, educação publica e a defesa do SNS contra a privatização de hospitais e unidades de saúde local que apenas contribuem para proporcionar bons resultados e lucros a lobbies vários deixando para o SNS os casos mais graves, complicados e, por isso mais caros.
    Precisamos de defender as ideias de quem valoriza a Liberdade e a Democracia e esteja pronto para Portugal.

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